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Bolsista kempi de 2022 : Jessica Yamada

A província de Okinawa oferece bolsas para descendentes de okinawana e jovens de países asiáticos. O bolsista poderá estudar em universidades, ou especializar-se em escola de Artes Tradicionais ou obter experiência profissional em empresas de Okinawa. Desse modo, o bolsista poderá aprofundar seus conhecimentos sobre a história, cultura e costumes de Okinawa, bem como adquirir experiência de trabalho e fortalecer os laços de amizade com os okinawanos. Espera-se que no futuro, o bolsita contribua com a herança da Rede Mundial Uchina pelas próximas gerações e que sirva de ponte entre Okinawa e seu respectivo país natal.


Entrevistamos Jessica Yamada, uma bolsista de 2022.
Segue abaixo o relato da Jessica.



1.País de origem.

Brasil, São Paulo, Capital.


2.Ocupação no seu país
Atuo como ceramista autônoma. Tenho uma produção pequena de encomendas e peças autorais, participo de pequenas feiras e algumas edições do Festival de Okinawa no Carrão pelo espaço cultural do Urizun. Dou assistência em alguns ateliês e começo desse ano de 2022 comecei a dar aulas de cerâmica no ateliê Sueli Massuda e alguns workshops no ateliê Muriqui.


3.Origin de seus Ancestors (uyafafuji)
Sou uchinanchu por parte de mãe. Minha obá é de Yonabaru e meu odi de Urasoe.


3.O que você está fazendo atualmente ou que pretende fazer durante sua bolsa em Okinawa?
Atualmente estou cursando um semestre no curso de cerâmica da Universidade de Artes de Okinawa. As aulas começaram em Outubro e desde então tenho praticado de segunda a sexta a tarde toda, sigo a programação de aulas da turma do segundo ano que consiste em aprender a fazer copos, makais e pratos, respectivamente.
Fazemos sempre uma forma básica e outra de livre autoria. Com a instrução do professor Shimabukuro aprendi a forma tradicional de Okinawa, um formato mais bojudo e a boca é levemente curvada para fora. Após essa explicação eu tenho percebido melhor essa identidade nas cerâmicas aqui. 



Nesta semana faremos a queima no forno Noborigama, um forno a lenha e bem grande que tem na faculdade, que atualmente é o único forno que pode ser usado na cidade de Naha, por conta de ser uma instituição de ensino e da quantidade de fumaça que produz. No Brasil tem esse tipo de forno, mas eu nunca participei ou acompanhei nenhum evento do tipo, então poder ter essa experiência pela primeira vez e em Okinawa é bem especial, estou bem animada. Estou ansiosa por uma aula mais específica sobre cerâmica de Okinawa, yachimun, que teremos em Janeiro e pretendo visitar e frequentar mais as lojas de cerâmica da Rua de Tsuboya aqui em Naha e outros ateliês fora, principalmente os da cidade de Yomitan que representam bastante as produções de yachimun.
Além da cerâmica eu pude me inscrever em outras aulas na faculdade como karatê e história do artesanato de Okinawa.
Tem sido muito bom, pois nunca havia praticado karatê e eu sei que era uma atividade que meu odi praticava antigamente, então de certa forma me sinto mais conectada com ele, mesmo não estando mais no mesmo plano. E nas aulas de história do artesanato de Okinawa até agora vimos sobre arte laca,
tecelagem, cortes e tecidos das vestimentas tradicionais e cerâmica. É interessante conhecer mais sobre outros tipos de função dessas expressões artísticas, principalmente da cerâmica além do utilitário da mesa de jantar, como as usadas no butsudan e nos túmulos.
E também as influências e contexto histórico que cada arte se manifestava.


4.Palavras que mais gosta de Okinawa (Utinaguti).
Gosto muito das palavras tiburu e gatimaya.
Tiburu foi a primeira palavra que aprendi ainda pequena. Acho que estavam me explicando o contexto de tiburu magi, frase que minha mãe e meu pai costumavam ouvir de vez em quando do meu odi, que significa cabeça grande, cabeção. Bom, aprendi que tiburu era cabeça e magi era grande, mas não lembro de terem me explicado a origem delas, então para mim era japonês.
Na aula de japonês da escola eu fui mostrar o que aprendi e ninguém entendeu, foi uma sensação de estranheza e uma breve reflexão se o que aprendi era de verdade.
Outra palavra que surgiu mais tarde foi gatimaya, não lembro a época exatamente, mas acho que sempre foi falada, pois desde pequena sou bem gatimaya, eu e meu pai. E meu tio também abriu um restaurante chamado gatimaya que fez todo sentido e reforçou ainda mais a palavra para mim.


5.Você já participou de um Festival Mundial Uchinanchu?
Não, esse ano foi a primeira vez.


6.Quais são as suas impressões sobre o 7o Festival Mundial Uchinanchu deste ano?



Foi bem emocionante e uma coincidência muito feliz. A minha bolsa era para ter acontecido em 2020, mas foi adiada por conta do coronavírus até esse ano e até o meio do ano não tínhamos muita certeza das coisas, nem imaginava que haveria de fato o festival também.
O primeiro evento foi o desfile dos países pela Kokusai Dori. Fiquei muito impressionada com a dimensão que o Uchinanchu Taikai tem, são vários, muitos países que possuem conexão com Okinawa. Mesmo com o número de participantes super reduzido, ainda foi um evento bem grande, não consigo imaginar como eram os anteriores. O desfile do Brasil foi conduzido pela Midori san, proprietária do restaurante Punga Ponga, um restaurante de culinária brasileira nos arredores da kokusai dori. A Midori san, a banda e as passistas são todas okinawanas que amam o Brasil, e é incrível que tem tanta gente de tão longe que ama nosso país e cultura.
Todos os países se organizaram em uma travessa da avenida principal e enquanto esperávamos nossa vez ocorriam ensaios e conversas. Uma delas, foi com uma senhora que perguntou se podíamos tirar uma foto com ela, pois esse ano os familiares dela que moram no Brasil não puderam ir para o reencontro e ela estava bem triste, mas ficou contente de ver que tinham alguns brasileiros presentes para representar a família dela, fiquei muito comovida.
Nós bolsistas ficamos na ala das bandeiras pulando, gritando, dançando enquanto seguíamos logo atrás da banda. E andamos muito, admito não estar preparada para tanta atividade física, mas foi bem divertido e emocionante, pois enquanto desfilamos as pessoas, principalmente as oba sans gritavam “Okaeri” e davam lembrancinhas e omamoris para nós.
Por conta da chuva intensa no dia da abertura, a cerimônia que seria conduzida no Cellular Stadium, estádio de beisebol, foi transferida para um espaço bem menor e acesso limitado.
Assim, a maioria de nós bolsistas nos reunimos na Jica Okinawa e acompanhamos os discursos e apresentações pela plataforma online, então ainda foi divertido celebrar juntos e conhecer e reencontrar outros bolsistas de outros países e programas de bolsa.
No primeiro dia do festival nós bolsistas Kenpi participamos do evento Overseas Kenjinkai Presidents Uchina Goodwill Ambassadors, tivemos a oportunidade de conhecer e conversar com integrantes importantes da comunidade okinawana do Brasil e do mundo. Comecei no grupo dos brasileiros e em uma dinâmica de grupos troquei para um com uma representante da Nova Caledônia ela explicou que existem muitas culturas em seu país, incluindo de Okinawa, mas que ainda precisa ser fortalecida e por isso que ela participa das conferências em busca de soluções de como incentivar e criar espaços e eventos para que as pessoas descendentes tenham interesse em conhecer mais sobre.
No segundo dia de festival as prefeituras de Okinawa receberam seus descendentes. Eu participei do evento de Urasoe e foi bem nostálgico rever o prédio e as pessoas da prefeitura que frequentei e convivi bastante durante a bolsa shichoson sete anos atrás e levei uma bronca da minha antiga responsável da época, pois esqueci de avisar que já estava em Okinawa fazia um mês.
No evento de recepção não éramos muitos e eu era a única da américa latina como participante e senti uma pressão quando descobri na hora que teria que fazer um breve discurso representando o Brasil. Pude reencontrar dois ex bolsistas kenshuu brasileiros que vieram para acompanhar o evento pela prefeitura de Urasoe e foi especial, pois um deles fez a bolsa kenshuu comigo. Além disso, foi possível interagir com os outros ex-bolsistas e integrantes do kyoyukai de Urasoe pela transmissão ao vivo online que acordaram cedinho para acompanhar as apresentações.



Uma das apresentações foi de ryukyu buyou do dojo que frequentei durante a bolsa, ver que as professoras ainda estão bem, lecionando e dançando me deixou muito feliz.
Outro fato que me comoveu muito nesse dia foi um senhor havaiano, Nishihara san, que me procurou quando soube que era brasileira perguntando se eu conhecia uma pessoa chamada Shigeyuki. Eu demorei um pouco para entender, até confirmei o sobrenome e ainda confusa eu concluí que era meu tio, mostrei uma foto e ele confirmou. Ele perguntou se estava tudo bem, pois eles só se encontram no Uchinanchu Taikai, sem telefone ou
cartas, e como meu tio não estava, ficou muito preocupado. A expressão de alívio dele quando soube que estava tudo bem e que não veio por conta do coronavírus me deixou muito emocionada. Eles se comunicavam apenas por gestos, pois nenhum deles falava a língua do outro e mesmo assim, Nishihara-san vai aos festivais na esperança de encontrar seu amigo brasileiro.
No dia do encerramento o tempo abriu e foi possível realizar a cerimônia em toda sua potência. Ouvir os discursos e apresentações ao vivo ao lado de tanta gente é muito diferente, muito melhor, ainda mais que foi a primeira vez dentro de um estádio de beisebol acompanhando um super pôr do sol e encerrando com um show de fogos maravilhoso.
É muito emocionante pensar que a comunidade okinawana é tão grande e forte ao ponto de nos reunirmos de todos os lugares do mundo onde compartilharmos da mesma cultura e história e nos juntamos nesse reencontro imenso que é o Uchinanchu Taikai.


7.Como é sua vida em Okinawa atualmente,tá feliz?
Minha vida em Okinawa tem sido bem boa, estou feliz sim. Recebo muita ajuda tanto dos meus parentes quanto do pessoal da UNC e de amigos que fiz no caminho nos assuntos mais sérios e mais banais do cotidiano. Além do suporte do Brasil das pessoas que amo.
Como sou uma pessoa bem tímida estou contente de conseguir tomar algumas iniciativas para interagir com os outros, praticar japonês, inglês e preciso me arriscar um pouco mais no espanhol. É muito especial e enriquecedor ter oportunidade de conhecer uchinanchus de outras partes do mundo também, ouvir as experiências de cada um e perceber que a gente tem muitas semelhanças mesmo estando tão distantes.
Participei pela primeira vez no World Youth Uchinanchu Festival de forma online e presencial e foi muito divertido e importante ver que os jovens uchinanchus do mundo estão interessados em compartilhar e conhecer mais sobre suas heranças culturais. Eu já não sou tão jovem assim, mas gostaria de me incluir nesse grupo também. Nunca é tarde para querer conhecer sobre quem somos e de onde viemos.
Nos finais de semana é dia de limpeza da casa e sair, sozinha ou com os outros bolsistas para lugares novos ou só para nos reunirmos e conversarmos mesmo.
Durante a semana nos dias em que estou mais cansada ou introvertida é só comer um docinho ou oniguiri, chegar na faculdade e praticar cerâmica que eu fico bem. Tem sido uma experiência incrível frequentar esse espaço, pois é uma infraestrutura que não existe no Brasil, não há um curso de graduação em cerâmica. Eu lembro a sensação do primeiro dia de aula de ver tantos tornos elétricos; fornos elétricos, a gás e a lenha; espaço para armazenar e produzir; cada aluno tem seu próprio espaço de trabalho que será usado durante o semestre todo; maquinários específicos que dificilmente vemos em ateliês no Brasil, enfim fiquei e ainda fico maravilhada. 




8.O que você vai fazer para fortalecer a rede Uchina quando voltar para o Brasil?
Estou bem animada em compartilhar toda minha experiência aqui. Gostaria de falar sobre as particularidades que estou aprendendo sobre cerâmica, pois quando estava no Brasil não tive muita oportunidade de ouvir dos outros sobre cerâmica utilitária de Okinawa, sentia muita falta desse assunto. Espero através dessas conversas conhecer mais pessoas que são desse meio ou que apreciam essa arte e aprender ainda mais uns com os outros.
Com certeza vou continuar participando e ajudando nos eventos relacionados a cultura de Okinawa onde moro e nos outros estados seria legal também.
E estou bem animada em voltar e continuar estudando sobre e tentar aplicar o máximo das coisas que aprendi sobre yachimun na minha produção, pois é meu meio de expressão artística e de identidade.
Com certeza me sinto mais motivada e com mais certeza de que eu amo o que faço, é uma sensação incrível.
Acho importante poder falar também das dificuldades que passamos também para que próximos bolsistas estarem ciente que nem tudo é perfeito mas que não estão sozinhos.


9.Quais são as semelhanças entre seu país e Okinawa que eu não conhecia antes.
Na primeira vez que estive em Okinawa eu vivenciei que os ônibus atrasam igual São Paulo, ou que haviam plantações de banana e cana por aqui. Eu achei que já conhecia tudo, mas o que eu não sabia é que tem muito pé de papaya por aqui, eu não lembro de ver essa fruta por aqui antes, ou não dava tanta importância quanto agora. O motivo é que no Brasil meu tio tem um pé de papaya, mas ele não evolui muito, então faz um tempo que eu observo seu desenvolvimento e passei a perceber os pés de papaya que achava por São Paulo.
Aqui em Naha eu moro em um bairro bem residencial e no caminho para faculdade que faço a pé passo por uma casa com um pé de papaya lindo no jardim e dentro do vaso.



 Logo na entrada da Faculdade existe o pé mais carregado e bonito que já vi e logo de vista da varanda do meu apartamento tem um pé super alto na casa vizinha. Como na época ainda estava bem quente todos os dias eu acompanhei algumas frutas amadurecerem, sendo colhidas ou não, e ainda olho eles todo dia. Mas não é só em Naha, tem papaya por todo canto dessa terra.



No começo de Outubro no início das aulas houve uma recepção para os estudantes internacionais desse semestre e recebemos cada um um bentô bem bonito com elementos da culinária de Okinawa. Um deles era uma saladinha que parecia ser de abobrinha e enquanto comíamos a professora explicava o que era cada comida. Ela percebeu que a maioria das pessoas estavam estranhando a salada e explicou que era feita de papaya verde, eu admito que comecei a mastigar mais devagar, mas para tentar entender que aquilo era papaya.
Aprendemos que aqui em Okinawa faz parte da culinária comer a papaya ainda verde em forma de salada e não como fruta, eu fiquei bem surpresa e com mais interesse em acompanhar os pés que encontro por aí, ver se as pessoas colhem verde ou madura.


10.O que o surpreendeu quando você veio a Okinawa (de uma boa maneira).
Me surpreendeu e ainda surpreende como as pessoas são receptivas e atenciosas.
Eu ainda lembro quando vim a primeira vez em 2015 pela bolsa shichoson de Urasoe, minha família que eu nunca encontrei, nunca conversei, me acolheu de maneira tão calorosa. E voltando agora sete anos depois me acolhem ainda mais.
Sem falar na ajuda que recebi e recebo no dia a dia de amigos, na faculdade, das pessoas da UNC, das pessoas com quem convivi sete anos atrás na prefeitura de Urasoe e de pessoas que mal conheço.
Em 2015 estava no ponto de ônibus e uma senhora começou a jogar conversa fora sobre o tempo e quando eu respondi ela me olhou e perguntou de onde eu era, pois eu falava com sotaque. Falei sobre a bolsa, conversamos e continuamos mesmo depois de entrar no ônibus, até fiquei apreensiva de levar bronca do motorista. Quando ela foi descer me entregou uma nota de 1000 ienes e disse para eu aproveitar, me esforçar e comer bem. Eu levei esse dinheiro comigo como símbolo de sorte e carinho, mas acabei gastando dessa vez, pois era desperdício também.
Agora uma história recente, o lugar onde moro é bem residencial e não tem mercado grande nem konbini por perto, fiquei bem desiludida e triste, pois teria que andar muito e fazer quase uma compra do mês para compensar o tempo de ir até lá.
Mas por sorte numa caminhada percebi que tem um mercadinho de bairro chamado Chinen por perto, minha salvação. É uma parte da casa do casal Kinjo e Chinen era o nome de solteira da dona.
O caixa é uma mesa que divide o espaço da loja com a casa deles, então ao pagar vemos a cozinha, toda de madeira mesa ao centro, sempre uma comidinha pronta para receber amigos e conhecidos.
Desde a primeira vez que fui lá me senti num ambiente muito familiar e confortável, espaço pequeno com cadeiras e pessoas sentadas conversando e os três gatos passeando e pedindo carinho no meio das prateleiras de produtos.

E fiz como um dos meus objetivos conversar com a Kinjo san e consegui. Conversa bem simples e rápida, mas já fiquei super feliz. Ela disse que está acostumada com jovens intercambistas, pois tem muitos na região e fica feliz falando sobre eles.
E quando soube que eu era bolsista me deu um cachinho de banana, outro dia que fui comprar arroz e nao tinha ela me deu um oniguiri, e assim em diante toda vez que vou lá recebo uma comidinha. Recentemente tem sido um macarrãozinho com legumes que me acompanha na janta do dia. Sempre que eu vou comer eu fico bem emocionada.
E algo que me deixa ainda mais feliz é ter o nome Chinen, pois era o sobrenome da minha Obá. Sei que não são parentes e que é um sobrenome bem comum, mas gosto de pensar que é minha Obá cuidando de mim também.

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